Mr. Angel

Escultura de Marc Quinn ©, com os transgêneros, Buck Angel e Allanah Starr
Escultura de Marc Quinn ©, dos transgêneros, Buck Angel e Allanah Starr

A esposa de Buck Angel, Elayne Angel menciona, no momento que estão em uma das convenções que frequentam, que ela precisa repetir algumas vezes para as pessoas finalmente compreenderem o conceito por trás da identidade deste astro da indústria de filmes adultos e palestrante motivacional. Outra entrevistada simplifica o conceito à sua questão anatômica: é um homem, com uma vagina. Com uma proposta muito além de sua anatomia, Buck aprendeu bem a lidar com a confusão que sua transgeneridade causa, mesmo depois de explicitada. De fato, ele soube converter isso em seu ganha-pão, sendo uma estrela na indústria pornográfica. Mas o documentário não compactua com um olhar de mero exotismo sobre seu protagonista, ao contrário, investiga seu cotidiano, seu passado, suas relações familiares, mostrando que aquele sujeito é bem mais que uma curiosidade sexual.

Como transexual masculino, ou trans-homem, Buck desafia algumas percepções somente ao apresentar-se como um homem viril e musculoso que é resultado da transformação de um corpo que já foi de mulher (Angel, inclusive, trabalhou como modelo feminino também nessa fase). Mas se transgêneros são um fenômeno pouco conhecido e que já provocam surpresa para muitas pessoas, sua incursão na indústria pornográfica ganhou um caráter emblemático ao desafiar certas expectativas sedimentadas sobre transexuais, como por exemplo, a rejeição à genitália. Sr. Angel não tem pudores em repetir diversas vezes que “ama sua vagina”. Ele não apenas decidiu recusar-se à cirurgia de redesignação sexual, que lhe daria um pênis não plenamente funcional,  mas faz suas performances na indústria de filmes adultos com a prática de relações com penetração vaginal. Entre seus parceiros de filmes, há mulheres, homens (entre eles gays e bissexuais) e mulheres transexuais, como a atriz Allanah Starr.

Construindo um corpo à sua medida, rejeitando e lutando contra paradigmas, Buck teve um vida de desafios constantes, a começar pela rejeição familiar, que no momento do documentário encontra-se em restabelecimento da relação, com espaço para o tempo de curar as profundas feridas e fantasmas de culpa, em especial da relação dele com seu pai. Esse sofrimento e esforço é mostrado com toda dignidade de um pai e mãe que buscam legitimamente conciliar sua parentalidade com um caminho que foi bastante tortuoso para todos. Mesmo ali, é possível ver momentos de alegria e uma leveza que Buck Angel orgulhosamente consegue trazer para sua vida. Aliás, é o cotidiano, simples, verdadeiramente frugal e leve (no momento da filmagem Buck está vivendo numa pacata casa no Mexico com  Elayne), que produz um encanto e dão a dimensão humana da longa jornada de um homem para torna-se quem é.


Mr. Angel (Mr. Angel, 2003)
Documentário, 68 min
Direção: Dan Hunt

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