Meu passado me condena (Victim, 1961)
Ficha Técnica:
Direção: Basil Dearden
Escrito por: Janet Green
Estúdio: Rank film studios
Duração: 100 minutos.
Sinopse:
Na conservadora Inglaterra dos anos 1950-60 o jovem Jack “Boy” Barret (Peter Mc Nemery) está em sérios apuros: é vítima de chantagem para que sua homossexualidade e a ligação romântica com um famoso advogado não seja publicamente revelada. Perseguido e capturado pela polícia, o jovem opta por se calar definitivamente para não envolver seu parceiro, Melville Farr (Dirk Bogarde). O filme adentra habilmente o submundo gay masculino da Inglaterra pós segunda guerra mundial, mostrando o lado mais sórdido das legislações que puniam relações sexuais entre homens, tornado-os vítimas potenciais de escroques ou da prisão.
Porque ver esse filme:
Este filme causou mal estar na corte britânica de censura, que via como inadequada a apresentação da homossexualidade sob um viés menos negativo, e a relativização das convicções morais, já que a personalidade mais conservadora do filme é bem pouco simpática. Recebeu uma nomeação para o Leão de Ouro do Festival de Veneza em 1961, e duas para o BAFTA de melhor ator e melhor roteiro em 1962. Muitos identificam neste filme o mérito de ter aberto espaço para discussão sobre a homossexualidade que levaram a onda de manifestação por maior liberdade sexual no final da década de 1960 e nos anos 1970.
Temas e questões:
O principal tema do filme é a criminalização da homossexualidade, mostrando o absurdo das punições que, em lugar de moralizar ou impedir desvios sexuais, levavam a multiplicação de delitos. Dentro das possibilidades do começo dos anos 1960, o filme tenta questionar a percepção dos homossexuais como criminosos, tratando-os como vítimas de uma sociedade profundamente preconceituosa e hipócrita em lugar de corruptores.
Comentário (Spoilers):
Foi um dos primeiros filmes a apresentar a homossexualidade sob uma ótica não negativa. A roteirista, Janet Green tinha interesse em desenvolver argumentos sobre mazelas sociais causadas pelo preconceito, e já havia discutido o racismo contra os afro-caribenhos no filme Sapphire (1959). Dirk Bogarde, que interpreta habilmente o protagonista Melville Farr foi vítima, ao longo de toda a vida, de boatos sobre a sua sexualidade – principal razão pela qual este ator não foi convidado a protagonizar filmes em Hollywood. Ainda assim, Bogarde insistiu em fazer o papel. Farr, é apresentado como um homem que possui os impulsos homossexuais, mas que estava disposto a resistir a eles em nome da integridade e do casamento. Aliás, é em disto que Farr sacrifica sua carreira, trazendo a justiça a quadrilha de chantagistas.
Vale ressaltar que o retrato da inadequação da legislação sobre a homossexualidade já era questionada na imprensa desde os anos 1950, na esteira do suicídio de Alan Turing, de Kenneth Crowe e de julgamentos envolvendo Lord Edward Montagu, Michael Pitt-Rivers e Peter Wildeblood. Isto levou a formação de uma comissão parlamentar chefiada por Lord Wolfenden, que em seu relatório recomendava a discriminalização das relações consentidas entre adultos em locais privados. Em 1958 foi fundada a Homosexual Law Reform Society, que militava por mudanças na lei. Ainda assim, apenas nove anos depois, no Sexual Offence Act de 1967 as relações entre homens foram discriminalizadas na Inglaterra. Vale ressaltar que outros grupos, como o Gay Liberation Front e a Campaign for Homosexual Equality ainda assim acusavam esta última legislação de ainda ser excessivamente preconceituosa.
Destaque para o detetive Harris, no seguinte diálogo com seu subordinado, sargento Bridie:
“Você está bem puritano, Bridie”
“Não vejo que mal há nisso”
“Houve uma época em que isso era crime também”
O longa também causou reações negativas do corpo de censores de Hollywood. Diferente do longa Sudenlly, Last Summer (1959) que só foi permitido depois de mostrar os horrores do estilo de vida homossexual e de apresentar referências cifradas ao tema, Meu passado me condena foi acusando de ser excessivamente liberal e aberto no tratamento desta temática
Coordenador do Núcleo UniSex, escreve sobre cultura LGBTQIA+, comportamento digital e saúde mental. Atua como psicoterapeuta afirmativo e de casais/famílias diversas em neuropsipro.com.
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