Alison Bechdel escreveu um livro incomum num gênero pouquíssimo explorado: sua obra pertence a um gênero já chamado por alguns de graphic memoir que seria uma Graphic Novel (o romance em forma de quadrinhos, este próprio um produto desconhecido do grande público) mas com o diferencial de possuir um conteúdo autobiográfico. Se a ousadia na forma do trabalho não é mérito suficiente, a sensibilidade e honestidade com que ela desnuda sua infância e seu relacionamento com o pai explicam muito bem o prêmio Eisner Award de 2007 e a eleição como o melhor livro de 2006 pela Revista Time.
Fun Home, apelido dado por ela e seus irmãos a funerária e casa onde moravam, trata da investigação e reconciliação com a figura ambígua de seu pai que morreu sob a suspeita de ter cometido suicídio. Alison, que eventualmente acaba por descobrir-se lésbica na adolescência, se defronta com a realidade da homossexualidade ocultada por seu pai e das repercussões de eventos do passado que só serão perfeitamente compreendidos muitos anos depois. Na verdade é possível perceber que é no próprio livro que esta conciliação se materializa e é colocada em ordenada. Bechdel não nos entrega uma conclusão, e neste caso a forma de composição do livro é metáfora perfeita para o seu processo criativo: é em cada traço de sua arte que se delinea a figura do pai e os laços com o passado são refeitos. A narrativa nem sempre é precisa, ou linear, como a memória que Bechdel quer dar sentido.
Os prêmios do livro garantiram a produção de uma edição brasileira bem como um certo destaque na mídia que é incomum para estas publicações (seja pelo formato em quadrinhos, seja pelo tema da homossexualidade). O próprio trabalho de Alison com suas tiras Dykes to Watch Out for, embora já fosse internacionalmente conhecido, costumava ser circunscrito aos jornais alternativos. É bom ver as barreiras culturais serem transpostas e obras como essa ganharem espaço pelo seu significado universal e qualidade.
Coordenador do Núcleo UniSex, escreve sobre cultura LGBTQIA+, comportamento digital e saúde mental. Atua como psicoterapeuta afirmativo e de casais/famílias diversas em neuropsipro.com.
Absolutamente delicioso de ler, além disto. Bechdel mistura habilmente ironia e tragédia quando fala do paralelismo entre a vida do pai e a vida dela mesma – inclusive com a saída do armário.}
Me lembra CRAZY, com os desencontros entre pai e filha/o ao longo do tempo.
Qual foi a editora responsável pela publicação de Fun Home de Alison Bechdel ? Avisem para relançar esse livro, porque estou querendo comprar. Já tenho Você é Minha Mãe da mesma autora.
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Rodolpho, foi publicada pela CONRAD no Brasil e ainda pode ser encontrada em algumas livrarias, principalmente para venda na Internet.